Peixes e arte de interpretar

Alberto Cristini pintando em Veneza, Itália (1997)


Neste primeiro dia de Lua Nova em Peixes, portanto o início da última lunação antes do novo ano astrológico, e tendo Mercúrio, o regente da palavra, ressurgido das águas em que esteve submerso, em dulpa debilidade (exílio e queda), nas últimas semanas (esteve em Peixes desde o dia 23 de fevereiro, ingressando em Áries na madrugada de hoje, dia 10 de março), trago Fernando Pessoa - ele, apenas ele, um dos únicos a conseguir exprimir a profundidade da abstração dentro do que se entende por linguagem.

Peixes é um signo regido por dois astros considerados benéficos, Júpiter por domicílio e Vênus por exaltação, sendo ele o encerramento do inverno setentrional que se dá pelas águas mutáveis, noturnas e femininas, anunciando a chegada da primavera astrológica.

Este texto que agora transcrevo abre o livro Mensagem, e também foi incluído no O Caminho do Louco (1994), de Roberto Caldeira, um mestre da arte do Tarot, por quem nutro amor e um grande respeito, e cuja obra recomendo fortemente.

Creio que todo oraculista deveria, se não ter entre as suas leituras de cabeceira, ao menos conhecer a obra de Pessoa. Todo oráculo é símbolo, sendo o oraculista o seu intérprete.

As palavras em itálico são grafias minhas.

Nota Preliminar

    O entendimento dos símbolos e dos rituais (simbólicos) exige que o intérprete possua cinco qualidades ou condições, sem as quais serão, para ele, mortos, e ele um morto para eles.
    A primeira é a simpatia, em grau de simplicidade e conformidade com as citações. Tem o intérprete que sentir simpatia pelo símbolo que se propõe interpretar.
    A segunda é a intuição. A simpatia pode auxiliá-la, se ela já existe, porém não criá-la. Por intuição se entende aquela espécie de entendimento com que se sente o que está além do símbolo, sem que se veja.
    A terceira é a inteligência. A inteligência analisa, decompõe, reconstrói noutro nível o símbolo; tem, porém, que fazê-lo depois que, no fundo, é tudo o mesmo. Não direi erudição, como poderia no exame dos símbolos, é o de relacionar no alto o que está de acordo com a relação que está embaixo. Não poderá fazer isto se a simpatia não tiver lembrado essa relação, se a intuição a não tiver estabelecido. Então a inteligência, de discursiva que naturalmente é, se tornará analógica, e o símbolo poderá ser interpretado.
    A quarta é a compreensão, entendendo por esta palavra o conhecimento de outras matérias, que permitam que o símbolo seja iluminado por várias luzes, relacionado com vários outros símbolos, pois que, no fundo, é tudo o mesmo. Não direi erudição, como poderia ter dito, pois erudição é uma soma; nem direi cultura, pois a cultura é uma síntese; e a compreensão é uma vida. Assim certos símbolos não podem ser bem entendidos se não houver antes, ou no mesmo tempo, o entendimento de símbolos diferentes.
    A quinta é menos definível. Direi talvez, falando a uns, que é a graça, falando a outros, que é a mão do Superior Incógnito, falando a terceiros, que é o Conhecimento e a Conversação do Santo Anjo da Guarda, entendendo cada uma destas coisas, que são a mesma da maneira como as entendem aqueles que delas usam, falando ou escrevendo.

Pessoa, Fernando. Mensagem. Ed Principis, 2019.

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