O Oráculo de Delfos


Sacerdotisa de Delfos (1891), de John Collier.

Uma profusão de ofertas e serviços que contribuem para o assim dito autoconhecimento de cada um de nós é algo difícil de se ignorar atualmente. O Tarot, assim como a astrologia e outros meios de leitura e interpretação simbólicas do destino, é uma prática que vem crescendo vertiginosamente nos últimos 30 anos - especialmente desde os anos 2010, quando a internet e as redes sociais chegaram para ficar e diminuir as distâncias não só entre nós humanos, mas sobretudo entre nós e o conhecimento que nos foi legado.

O conhecimento de si mesmo é uma das maiores marcas que dividem a filosofia, em particular a grega, como a pré-socrática e a socrática. Conhece-te a ti mesmo (em grego, gnōthi sauton) é uma das inscrições das paredes do antigo Templo de Apolo, que ecoou e ainda na história ocidental até hoje.

Hoje venho falar daquele que seria o fundador da tradição oracular para o mundo ocidental (ao menos, aquele de que se tem registros até hoje): o Oráculo de Delfos.

 

Delfos (1894), em seu auge, imaginada pelo arquiteto Albert Tournaire.

Delfos é o nome da cidade grega situada nas encostas do monte Parnaso, onde foi erguido o Templo de Apolo, o lugar sagrado dedicado ao culto do Deus que, sendo um Deus solar, regia a luz, o conhecimento, a cura, a verdade e a profecia - consequentemente, os oráculos. Filho de Zeus e de Hera, diz-se que Apolo recebeu este local sacro de seu pai quando o Deus dos Deuses, para delimitar o espaço que doaria ao seu filho, mandou que duas águias saíssem de pontos opostos e equidistantes da Terra simultaneamente, voando uma em direção à outra. Assim, elas encontraram-se em Delfos, a cidade que passaria a ser considerada então o umbigo do mundo. 

Ali era também o lugar onde se dizia viver uma grande serpente, a Pytho (serpente, em grego), que Apolo dominou e matou, sendo este nome, por isso, incorporado também a um dos seus epítetos, assim como o das sacerdotisas do templo, chamadas pítias.

Pessoas de várias partes da Grécia e do mundo antigo iam à antiga Delfos fazer a sua peregrinação em direção ao oráculo, sendo esta consulta uma parte fundamental da tradição religiosa grega. Embora não se tenha uma data exata da sua construção, indícios apontam que o templo de Apolo foi erguido entre os séculos VII e VI a.E.C.


Cena de Édipo Rei (1967), longa de Pier Paolo Pasolini, disponível no YouTube.

O Oráculo de Delfos é também muito mencionado nas tragédias gregas, sendo a mais conhecida a de Édipo Rei (cerca de 427 a.E.C.), de Sófocles. Em uma das versões do enredo, Édipo envia Creonte ao oráculo para saber o que deve ser feito para que uma peste não assole a cidade de Corinto - e é a partir desta consulta que a trama se inicia, dado que o seu destino finalmente é revelado como o resultado do cumprimento de uma profecia.

 

O Tarot é oráculo?

Dito tudo isto, cabe dizer que função primordial do Tarot não é a de ser um oráculo, embora nada exista para instituir esta proibição. Os 78 arcanos são mistérios que traduzem o enredo da própria experiência humana. Como sempre digo aqui: o Tarot é o Livro da Vida, que se abre àqueles que saibam ler, principalmente, as suas entrelinhas.

Quanto mais rico o repertório simbólico daquele que lê, melhor a compreensão da leitura.

Oráculos, por sua vez, são a resposta dada pelas divindades em relação àquilo que se pergunta, assim como acontecia em Delfos. Uma sacerdotisa ou sacerdote fazem a intermediação dessa comunicação ao consulente, que geralmente recebe  a sua resposta através de enigmas, que podem às vezes levar anos para ser decifrados.

O próprio Sócrates começou o exercício da sua filosofia a partir de uma consulta ao Oráculo de Delfos feita por seu amigo, a respeito dele. Foi o Oráculo que disse a ele que Sócrates seria o homem mais sábio de todos os homens, e a partir deste enigma é que, depois, de um longo processo de investigação e tentativa de compreensão, Sócrates vai entender que ele é o mais sábio justamente porque ele não sabe.


Na imagem acima, a única representação histórica da sacerdotisa, ou pitonisa, de Delfos, da época em que o oráculo estava ativo, mostra a câmara de teto baixo e a pitonisa sentada em um trípode. Em uma das mãos ela segura um ramo de louro (a árvore sagrada de Apolo); na outra ela segura uma taça contendo, provavelmente, água proveniente de uma fonte e que penetrava, borbulhando, na câmara, trazendo consigo gases que levavam a um estado de transe. Esta cena mitológica mostra o rei Egeu de Atenas consultando a primeira pitonisa, Têmis. A peça foi feita por um oleiro ateniense em torno de 440 a.C.

Além disso, há um fundo de religiosidade por trás dos oráculos, que são comuns a várias culturas que ritualizavam suas crenças. A ritualística também pode estar presente em uma leitura de Tarot, mas não é obrigatório que esteja.

  

E a astrologia, afinal, é ou não um oráculo?

A astrologia ocidental pode ser considerada um ofício oracular com alguma licença poética, já que os mapas astrológicos, que geralmente são a base de uma consulta, representam uma comunicação do céu conosco. Planetas, estrelas e constelações são tradicionalmente entrelaçadas às antigas religiões, desde o início da sedentarização humana no Crescente Fértil (10 mil anos a.E.C.) até o período helenístico (entre os sécs III-II a.E.C.).

Um mapa, seja ele de um nascimento, de um evento específico ou de previsões, é um registro de configuração celeste - o cosmos onde se encontram as Deusas, os Deuses e todos aqueles cuja história, na tradição, estão costuradas junto ao tecido do mundo divino.


Resumindo,

você é livre para escolher o caminho com que tem mais afinidade, e pode, inclusive, utilizar todos. Mas acima de tudo, é importante cultivar um bom critério ao escolher a pessoa ou o profissional que irá interpretar as mensagens relativas ao seu destino.

Um abraço estrelado!

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